“(…) o mal que existe no mundo provém quase sempre da ignorância, e a boa vontade, se não for esclarecida, pode causar tantos danos quanto a maldade (…)”. Camus (in “A peste”, SP, Record, 219, p. 125). Fotos: Divulgação, em destaque, Bruno Di Marino.
Em meio a tantas informações discrepantes de todos os cantos do globo (muitas vezes tardias) e a tantos espetáculos patéticos, entre nós, de política eleitoreira oportunista, o único consenso mundial produzido até agora em relação à pandemia do novo coronavírus é o de que o remédio para solucionar a devastadora depressão econômica que ela já arrasta consigo consiste no aumento da dívida pública; a convicção de que, nessa hora amarga, caberá aos Estados prover a manutenção da ordem pública sanitário-econômico-social. Se isso vale para a normalidade, valerá muito mais para a exceção. É o retorno triunfal, em carruagem celeste, de Lord Keynes, para gáudio dos publicistas.
Nomes normalmente não contam. Mas há vezes em que as coisas precisam ser chamadas pelo nome certo. Talvez esse tenha sido o erro na condução da Covid-19. A peste, que adormecia, voltou ululante do seu covil de mistério. Voltou repentina e avassaladora, como sempre, mas com outra forma, outro sortilégio, outro horror. E a sociedade – exilada, separada e com medo (esse essencialmente é o pacote da peste) –, está de joelhos diante do flagelo sanitário, moral e econômico que a devasta. É a hora do Estado; é a hora do seguro coletivo. Ou Lord Keynes só valerá para regar, em tempos de fartura, a farra irresponsável das pedaladas publicistas? Qual é o nexo, aliás, entre (a) o governo transferir renda para a sociedade; (b) os Estados e Municípios suspenderem suas dívidas com a União; (c) receberem recursos desta para a pandemia; d) declararem estado de emergência e calamidade pública; (e) terem com isso acesso ao FUNCAP; e) e o Poder Judiciário, que também é Poder Público, transferir o ônus econômico-financeiro do novo coronavírus para setores privados com a instituição de políticas públicas desarticuladas e desorganizadoras? A equação não fecha. E, se fechasse, não faria sentido. Se o fato é do Príncipe – e o isolamento social, ainda que seguindo a literatura médica internacional, não é mais do que isso -, cabe ao Príncipe remediá-lo.
Bruno Di Marino e Álvaro Ferraz*