Em tempos de mídias sociais e da aterrorizante boneca Momo, um jogo criado por uma imigrante brasileira na Suíça traz proposta contrária: olho no olho na hora de interagir. Fomos dar uma olhada…
A catarinense Rafaela Pinheiro tem só 36 anos, mas já passou por várias situações que a fizeram valorizar o diálogo e o olho no olho. Ela não sabe dizer se foi a morte de uma pessoa da família, momentos tristes pelos quais passou há alguns anos, se a vida de migrante na Suíça e a experiência da saudade dos parentes, ou se tudo junto. O fato é que ela mergulhou de cabeça em uma ideia antiga e criou o jogo de conversa Eye-fi, palavra em inglês que brinca com o wi-fi de conexão digital, com o eye, que quer dizer olho na língua britânica, e remete à comunicação à moda antiga, sem uma tela dividindo pessoas.
A brincadeira é um conjunto de 90 cartões, no tamanho de um jogo de cartas, com também 90 perguntas escritas em quatro idiomas (português, alemão, inglês e espanhol). Trata-se de um convite para que as pessoas tirem os olhos do celular e conversem, para que momentos em família e entre amigos sejam mais ricos, a conexão interpessoal aconteça e os laços de amor e carinho se fortaleçam.
Como o propósito do passatempo é estimular as pessoas a se conhecerem melhor, o jogo reúne questões que abordam desde a curiosidade em saber se o outro coleciona algum objeto a perguntas mais profundas, como o que mudaria na vida se pudesse voltar no tempo ou contar sobre algo que tenha feito e se sinta orgulhoso.
Intimidade – Para Rafaela, uma conversa que não seja à toa pode fortalecer amizades e laços familiares. O diálogo enriquece qualquer relação e faz bem à alma. “Pensei em uma série de perguntinhas divertidas, sérias e às vezes inusitadas, que poderiam fazer pensar além das conversas cotidianas. É preciso sair do automático e se revelar por completo para aqueles que amamos”, explica.
De acordo com a criadora, o ideal é que os participantes gastem entre dez a 15 minutos para responderem cada questão. Formada em Marketing, Rafaela tem recebido encomendas pelo siteLink externo que criou para vender o produto e em eventos onde vai. Ela diz que ficou surpresa com o resultado e com a boa aceitação do jogo, lançado informalmente no dia 8 de março, sem qualquer publicidade.
– Em um evento de 80 pessoas, foram embora 35 jogos em menos de uma hora – diz a criadora, que já vendeu quase todos os 200 exemplares trazidos do Brasil em janeiro e já pensa em imprimir a segunda remessa com duas línguas adicionais: o italiano e o francês. O jogo é comercializado por 20 francos.
Menos internet e mais conversa – Entre os consumidores do Eye-Fi, há quem utilize antes do jantar em família diariamente e há quem leve para a escola e proponha atividades com os professores. Com o surgimento de figuras aterrorizantes na internet, como a boneca Momo, que ensina o suicídio às crianças, o limite à rede e o estimulo ao diálogo tem sido recomendado por especialistas e adotado por pais.
A brasileira Renata Kalbermatten, que vive na Suíça, comprou o jogo e brinca antes das refeições com o marido e a filha. Os filhos de 12 e dez anos da cearense Bruna Aepli acharam nos cartões uma nova forma de brincar, já que não podem usar eletrônicos durante a semana. Mais preocupada com as relações humanas, Bruna prefere que os filhos conversem mais e se movimentem. Parece que a medida tem dado certo. Moradores de St. Gallen, as crianças levaram o jogo para a sala de aula e já tentam criar mais intimidade com os alunos e professores.
O fato é que o antigo e simples dedo de prosa continua sendo uma delícia para muitos. E para quem aprecia, o jogo parece ser um estímulo a mais.
Mais conversa e olho no olho
– Quando uma pessoa muito querida da minha família descobriu um câncer, no ano passado, pensei, junto com o meu filho de nove anos, em uma estratégia de aprofundar os laços que nos une. Eu já tinha desenvolvido o jogo e percebi, naquele momento, a real necessidade de utilizá-lo. Nos tocamos de que tínhamos muitas perguntas a serem feitas, muito a se descobrir sobre essa pessoa e pouco conhecimento – conta Rafaela Pinheiro, ao explicar como desenvolveu o Eye-Fi.
Fonte: jornalista Liliana Tinoco Baeckert