Por Mauro Magalhães – Ex-deputado e empresário.
Toda vez que chega o mês de dezembro, eu lembro das inesquecíveis conversas que eu tive com meu amigo, Juscelino Kubitschek, nos anos seguintes à decretação do Ato Institucional número 5 ( O AI-5 foi decretado, pelo Marechal Costa e Silva, em 13 de dezembro de 1968),
que resultou na cassação dos meus direitos políticos e de muitos outros colegas da política, que, como eu, participaram da Frente Ampla, pela redemocratização, em 1966 e em 1967.
O Ato Institucional número 5 foi lido, pelo então Ministro da Justiça, Gama e Silva, em pronunciamento feito pela TV, na noite de 13 de dezembro.
Tão logo foi lido o decreto, o Congresso foi fechado e meus amigos, Juscelino Kubitschek e Carlos Lacerda, foram presos.
Juscelino me contou, anos depois, que estava no Teatro Municipal do Rio de Janeiro, na noite em que foi anunciado o AI-5.
Juscelino tinha ido ao Municipal para ser paraninfo de uma turma de estudantes de engenharia .
Quando acabou a solenidade de formatura dos estudantes de Engenharia, naquela noite de 13 de dezembro de 1968, Juscelino foi levado, por policiais que entraram no Teatro Municipal para prendê-lo.
JK ficou preso em um quartel de Niterói, com a roupa do corpo.
Meu amigo, Carlos Lacerda, também foi preso. No dia seguinte à decretação do Ato Institucional número 5, preso no dia 14 de dezembro.
Lacerda foi preso pela Polícia Militar do antigo Estado da Guanabara.
Na prisão, Lacerda fez greve de fome durante uma semana e, só por isso, conseguiu ser libertado e ir para casa.
Por causa de nossa participação na Frente Ampla liderada por Juscelino Kubitschek, Carlos Lacerda e João Goulart, nós, udenistas que chegamos a apoiar a deposição de Jango, em 1964, sofremos muito, com o Ato Institucional número 5, decretado em 13 de dezembro de 1968.
Eu era muito amigo do Maneco Nascimento Brito e de outros diretores do Jornal do Brasil.
Para driblar a censura, lembro que o Jornal do Brasil, na época, publicou uma previsão do tempo em que dizia estar a temperatura ” sufocante “.
Eu só fui cassado pelo Ato Institucional número 5, no início do ano de 1969.
Além de ter sido preso no dia seguinte ao anúncio do AI-5, Carlos Lacerda também foi cassado. E isso significava que ele não poderia mais se candidatar à presidência da República.
Lacerda, em nossas conversas, me contou detalhes sobre a sua prisão, em 14 de dezembro. Na mesma cela em que ele ficou, no Regimento de Cavalaria da PM, também esteve preso o grande ator e compositor Mário Lago.
Juscelino Kubitschek já tinha sido cassado antes.
Forte candidato nas eleições de 1965, que não aconteceram, Juscelino Kubitschek era muito amado. Imbatível, em seus discursos emocionantes. Até quem era da oposição, como foi o meu caso, ficava fascinado com o carisma de JK .
Juscelino foi cassado em 8 de junho de 1964. Ele tinha apenas 62 anos, na época. Era senador pelo antigo PSD de Getúlio Vargas.
Depois de sua cassação, em 1964, meu amigo Juscelino viveu alguns anos no exílio, em Paris, Lisboa e Nova Iorque.
Muito querido por brasileiros e estrangeiros, ele encantava a todos, com palestras sobre o Brasil e a democracia.
Em abril de 1967, Juscelino voltou a morar no Brasil e foi nessa época, período áureo da Frente Ampla, que me aproximei dele e ia sempre visitá-lo, no apartamento da Avenida Atlântica .
Em meu livro, O Sonhador Pragmático, que escrevi, sobre meu amigo Carlos Lacerda, e lancei, pela primeira vez, em 1992 ( já está na quinta edição), eu conto como foi a participação de João Goulart, na Frente Ampla .
Jango, que morreu no dia 6 de dezembro de 1976, no exílio, também perdeu seus direitos políticos .
As atividades políticas da Frente Ampla foram proibidas pelo governo militar, em abril de 1968, através de comunicado feito pelo ministro da Justiça, Gama e Silva.
Juscelino me dizia, em nossas conversas antes dele morrer, em agosto de 1976, que Jango, assim como ele, JK, ficou muito triste, depois que se retirou, definitivamente, do cenário político, naquele primeiro semestre de 1968.
João Goulart morreu em sua fazenda na cidade argentina de Mercedes, de um ataque cardíaco.
Em meu livro, O Sonhador Pragmático, conto que Lacerda foi muito perseguido pelos militares, por causa de seus discursos bombásticos, contra o regime. Eu fui testemunha, quando acompanhei Lacerda, uma vez, a São Paulo, para ser paraninfo em uma formatura, no início de 1968, na Faculdade de Economia da Fundação Álvares Penteado.
Com medo da eloquência de Lacerda, que escrevia e falava muito bem, o governo militar incumbiu agentes da Polícia Federal a conseguirem o discurso, antes de ser lido.
Lacerda deu o texto aos agentes, mas, na hora de discursar, ele fugiu do que já estava escrito. Seu discurso foi um primor.
O AI-5 tirou de cena meus amigos Juscelino Kubitschek e Carlos Lacerda e impediu que João Goulart voltasse a se rearticular para retornar ao Brasil.
Apesar de minha origem udenista, depois do fim da Frente Ampla eu me aproximei muito de meus amigos juscelinistas e janguistas.
Nesse mês de dezembro, aos 88 anos, lembro, com carinho, do grande movimento que foi a Frente Ampla.
E, incluo, aí, além dos líderes Juscelino Kubitschek, João Goulart e Carlos Lacerda, outros amigos, como Hélio Fernandes, Renato Archer ,José Gomes Talarico e Rafael de Almeida Magalhães, nessas memórias sobre a democracia e a arte de conviver na política .