No ano passado, uma decisão da Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça (STJ) trouxe um elemento a mais em favor dos credores: flexibilizou o salário do devedor, historicamente protegido e considerado até então impenhorável – exceto nos casos de pensão alimentícia. O caráter da decisão, embora seja considerado excepcional, abriu uma nova possibilidade aos credores.
Nesta mesma linha, decisão proferida no início de 2024, pela juíza Ana Cristina Viegas Lopes de Oliveira, da 10ª Unidade Jurisdicional Cível da Comarca de Belo Horizonte, determinou a penhora de 20% de eventuais valores de FGTS do devedor até a integral satisfação do débito.
De acordo com os autos, o credor alegou ter buscado o pagamento do crédito por diversos meios, mas sem sucesso. Os bens e valores no patrimônio do devedor foram buscados, mas nada foi encontrado. Após consulta das declarações de Imposto de Renda do devedor na Receita Federal, o credor pediu o bloqueio do saldo do FGTS.
Renata Belmonte, especialista em Processo Civil e Líder em Recuperação de Créditos do escritório Albuquerque Melo, explica que o saldo do FGTS pode sim ser penhorado, já que é considerado verba salarial. Mas pondera que a decisão vale somente para o dinheiro que já está na conta. “Quando o trabalhador for ao banco sacar suas verbas, ele não terá a penhora realizada ali, na hora do caixa. O dinheiro precisa estar na conta dele. As verbas, quando recebidas pelo trabalhador, podem ser colocadas em sua conta corrente, e isso seguirá a ordem de penhora comum”.
Renata aponta que a opção de usar o FGTS para quitação de dívidas deve seguir uma ordem estabelecida pelo Código de Processo Civil. “A penhora do FGTS vem no ´final da fila’ da execução, após todas as tentativas de recuperação do valor que restaram infrutíferas”, diz.
Saque-aniversário também vale?
A advogada lembra também que a modalidade saque-aniversário do FGTS, quando o trabalhador pode sacar o valor que possui no fundo de forma parcial, uma vez ao ano, no mês de seu aniversário, também já deve estar no radar dos credores. “É um movimento que muitos já estão atentos para tentarem a satisfação do crédito. Entretanto, vejo com menor efetividade, uma vez que para que haja uma penhora, é preciso que exista uma ordem judicial, e o saque salário é feito de acordo com o cronograma estabelecido pelo governo, que se baseia na data de aniversário da pessoa”, argumenta.
Renata Belmonte entende que essa prática de cobrança de dívida pode, sim, virar uma tendência já que se trata de um dinheiro seguro. “O FGTS é considerado verba salarial, todavia, como temos acompanhado, essa regra vem sendo mitigada, visando a satisfação da execução. Muitos devedores retiram todos os bens de seu nome, visando frustrar os credores. No caso do FGTS, o devedor não consegue realizar essa manobra, de modo que os credores, atentos à mitigação da regra da impenhorabilidade salarial, têm, cada vez mais, feito esse pedido de penhora”, conclui.