Em 7 de abril, uma das maiores encenações da Paixão de Cristo do Distrito Federal reunirá mais de 80 atores em espetáculo a céu aberto, com expectativa de público de 10 mil pessoas
Há 31 anos, um grupo de fiéis da Comunidade Católica, da então Agrovila de São Sebastião (a emancipação à Região Administrativa data de 1993), decidiu narrar em forma de jogral a Via Crucis de Jesus Cristo, saindo da comunidade São Geraldo em direção à Paróquia Nossa Senhora Aparecida. Já em 2004, os fiéis desta Paróquia se uniram aos da Santo Afonso e, através do Caminhando com Jesus na Via Sacra, evolui-se para o formato de encenação teatral. Ganhava força, a partir daí, o que se tornou um dos eventos culturais e religiosos mais tradicionais do Distrito Federal. Realizado no Morro Bela Vista, em frente ao Parque de Exposição Agropecuário, desde 2008, a Encenação da Paixão de Cristo ao Vivo reunirá, em 7 de abril, mais de 80 atores em uma apresentação emocionante aberta ao público. Para o evento financiado com recursos do Fundo de Apoio à Cultura do Distrito Federal e pela comunidade de São Sebastião, são esperadas cerca de 10 mil pessoas.
“Foi um crescimento gradual, envolvendo cada vez mais gente e movimentando a cidade a partir da geração de empregos com a criação dos cenários, confecção de figurinos e uma série de outros serviços necessários para realizar o evento. Sem falar na parte sentimental, da fé das pessoas e do espírito de fraternidade, sempre muito aflorados nessa época. São muitos ensaios, com a maioria dos atores e figurantes moradores de São Sebastião. Então, acaba que se torna um congraçamento entre os fiéis, atores, cidadãos, enfim, a comunidade. A história é a mesma há 2023 anos, mas, revivê-la e ajudar a contá-la, traz sempre muito emoção e, principalmente, renovação”, afirma Gildivan Rodrigues, diretor cênico da Encenação da Paixão de Cristo ao Vivo, de São Sebastião, e presidente do Instituto Chinelo de Couro, mantenedor do evento desde 2012.
O espetáculo a céu aberto traz a comovente história da morte de Jesus Cristo em cenário especial. Construída pelas mãos de talentosos artesãos e artistas, a cenografia está instalada em meio a vegetação. Na parte da iluminação, a encenação, que começa às 18 horas, recebe um show de cores proporcionado pelo pôr-do-sol do Cerrado. “Esse espetáculo da natureza, combinado com a história contada, não há dinheiro que pague. É uma daquelas imagens que você guarda no coração”, conta Viviane Xavier, coordenara da Via Sacra de São Sebastião.
A carga dramática é intensa e permeia toda a apresentação. Nos ensaios, não se trabalha apenas a atuação. O controle emocional e a concentração são fundamentais para não ser levado pela comoção do público que reage a todo o momento, acompanhando o flagelo do Cristo. “São quatro meses de preparação física, psicológica e, principalmente, espiritual. Antes do espetáculo eu fico nervoso. Mas no final, podendo ver tantas pessoas emocionadas e receber o carinho daquela multidão, o sentimento é de realização e gratidão pela oportunidade”, compartilha o ator Vitor Caetano, o intérprete de Jesus Cristo, na produção.
No calendário oficial do Distrito Federal desde 2008, o evento ressalta a cultura como direito à cidadania e instrumento de integração social. Ao se promover e valorizar as manifestações culturais, laços comunitários e vínculos familiares e sociais são fortalecidos. A tradição é importante na vida do aposentado Manoel Augusto, pioneiro da Via Sacra: “Eu me lembro da 1ª edição. Quanta coisa se passou de lá para cá. Era somente uma caminhada. Hoje, aos 77 anos, vejo o surgimento de novos talentos, meus familiares envolvidos neste espetáculo de evangelização através do teatro. É muita felicidade. Agradeço a Deus”.
A “Encenação da Paixão de Cristo de São Sebastião” não se limita aos ensaios e à apresentação. A geração de emprego é fator importante na região administrativa com um dos menores Índices de Desenvolvimento Social do Distrito Federal, ao mesmo tempo em que se destaca como um celeiro em potencial de artistas. Ao todo, 150 pessoas, entre atores, artesãos, carpinteiros, costureiras, eletricistas, maquiadores, fotógrafos, cinegrafistas e tantos outros colaboradores de áreas diversas, atuam, diretamente, na produção. É o caso, por exemplo, da cozinheira e Eliene Souza, que aproveita para reforçar o orçamento com venda de lanches para os atores e equipe técnica. Cozinheira oficial do evento, ela faz o tradicional almoço de Sexta-Feira Santa. “Mas o que mais me emociona é preparar os pratos da encenação da Santa Ceia, e que não têm nada de cenográficos. É tudo de verdade e feito com o maior amor do mundo”, assegura dona Eliene.
Há, ainda, a realização de oficinas oferecidas à comunidade. Com o apoio de um profissional de Serviço Social, as dinâmicas trabalham a linguagem teatral, criatividade, estímulo à leitura e outras aprendizagens. Como consequência, além de conhecimento e descoberta de talentos promissores, ganha-se em integração, mobilização, noção de cidadania e ética social. A cada ano, as oficinas relacionadas à Via Sacra recebem cerca de 40 jovens que são preparados para atuar na Encenação.
Enredo
A encenação é fiel à Bíblia, com reprodução dos versículos nas falas dos personagens. Com duração de, aproximadamente, três horas, o espetáculo é dividido em atos.
Começa a partir do Sinédrio, tribunal onde Jesus é julgado pelos doutores da lei. Em seguida, Judas se encontra com Zeráh, para discutir sobre a prisão de Jesus e o sinal que daria para que ele fosse identificado. Logo após o último encontro com os apóstolos na Santa Ceia, quando Jesus Cristo institui a Eucaristia como o maior alimento da alma, todos seguem para o Monte das Oliveiras, onde passam a noite em oração. Quando os discípulos dormem, Jesus, angustiado e sabedor da grande provação que se aproximava, reza: “Pai, afasta de mim este cálice”. No entanto, sua confiança e obediência ao Pai são maiores: “…, mas que prevaleça a tua vontade, e não a minha”. Judas Iscariotes, indica quem é Jesus com um beijo em sua face, denuncia-o à guarda romana, que o leva preso.
A partir daí, dá-se a Via Crucis, passando por 15 estações:
Jesus é condenado à morte por Pôncio Pilatos; Jesus carrega a sua cruz; Ele cai pela primeira vez; encontro com Maria, sua mãe; Simão ajuda-o a carregar a sua cruz; Verônica enxuga o rosto de Jesus; Jesus cai pela segunda vez; Jesus consola as mulheres de Jerusalém; Jesus cai pela terceira vez; Jesus é despojado de suas vestes; Jesus é pregado na cruz; Jesus morre na cruz; Jesus é descido da cruz; Jesus é sepultado e ressuscita.
Sobre o Instituto Cultural Chinelo de Couro
Constituído e fundado em São Sebastião em 2002, o Instituto Cultural Chinelo de Couro é uma entidade sociocultural beneficente, sem fins lucrativos. Seu objetivo é incentivar ações culturais, sociais, esportivas e folclóricas, podendo realizar trabalhos em conjunto com outros grupos, entidades e empresas. Além da realização da Encenação da Paixão de Cristo ao Vivo, no local, é mantenedor da quadrilha Junina Chinelo de Couro e da Sociedade Esportiva Cavalo de Aço, através das quais desenvolve programas diversos. O Instituto atende a jovens e adultos, em situação de risco social ou não, buscando trabalhar a cidadania e o resgate da autoestima.
Serviço:
Encenação da Paixão de Cristo ao Vivo
Local: Morro da Bela Vista, em frente ao Parque de Exposição Agropecuário- São Sebastião
Horário: das 18h às 21h
Entrada: gratuita
Indicação: livre