Declaração sobre o “Mapa do Caminho” para uma Associação Estratégica Renovada Brasil na Espanha
Política

Declaração sobre o “Mapa do Caminho” para uma Associação Estratégica Renovada Brasil na Espanha

O presidente do Governo da Espanha, Pedro Sánchez, e o presidente da República Federativa do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva, mantiveram na data de hoje, em Madri, reunião no marco da Associação Estratégica estabelecida entre ambos os países em 2003 e reforçada nas Declarações de Brasília, de 2005 e 2017, e na Declaração de Madri de 2012. Durante o encontro, ambos os presidentes:

  1. Reafirmaram o compromisso com os valores fundamentais da liberdade, democracia, direitos humanos, igualdade de gênero e defesa do Estado de direito. Coincidiram quanto à importância de preservar a estabilidade das instituições e de protegê-las contra intoleráveis ataques à democracia, tais como os que comoveram o Brasil e o resto do mundo em janeiro passado.
  2. Examinaram o bom andamento das relações bilaterais e coincidiram quanto ao início de nova etapa na qual ambos os países confiam em que se produzam importantes avanços. Tomaram nota das perspectivas de fortalecimento do diálogo sobre políticas públicas para continuar avançando na construção de sociedades cada vez mais justas e inclusivas e no combate às desigualdades, bem como das oportunidades de cooperação nas áreas de comércio e investimento; segurança; trabalho; assuntos sociais, ambientais, do clima; e relacionados com a utilização de energias limpas; em matéria cultural, científica, educacional e consular; de justiça e segurança pública; e de combate à criminalidade transnacional.
  3. Sublinharam o objetivo mútuo de alcançar a igualdade de gênero e o empoderamento das mulheres. Coincidiram quanto à importância de colaborar para a promoção de políticas públicas de gênero e abordagens feministas em suas políticas exteriores, com o objetivo final de alcançar a igualdade efetiva entre mulheres e homens.
  4. Congratularam-se com os acordos recentemente assinados sobre cooperação no campo do turismo, e os assinados em matéria trabalhista, científica e universitária, por ocasião desta visita. Instaram à celebração, em breve, da reunião da Comissão Bilateral Permanente para dar seguimento adequado aos diferentes vetores da Associação Estratégica.
  5. Convieram quanto à necessidade de dar renovado impulso à agenda euro-latino-americana. Ambos os presidentes coincidiram quanto à importância da Cúpula UE-CELAC prevista para ocorrer em Bruxelas nos dias 17 e 18 de julho próximo e comprometeram-se a trabalhar juntos para gerar resultados equilibrados que contemplem os interesses dos governos e das sociedades das duas regiões e para que resulte também em um substancial reforço das relações entre duas regiões altamente compatíveis em modelos políticos, sociais e econômicos, e inseridas de maneira responsável em uma comunidade internacional baseada nos propósitos e princípios das Nações Unidas. Expressaram também o apoio ao desenvolvimento de uma agenda europeia de investimentos público-privados em áreas de interesse comum na América Latina (economia verde, transição digital e investimento social) que também promovam a conectividade econômica, de infraestruturas e digital entre ambas as regiões.
  6. Ambos os presidentes abordaram o estado das negociações do acordo União-Europeia-MERCOSUL e se comprometeram, durante as suas próximas presidências da UE e do MERCOSUL, no segundo semestre do presente ano, a impulsionar a assinatura do acordo entre as duas regiões que permita o aumento do comércio e dos investimentos em ambas as direções e a promoção da prosperidade compartilhada. Ambos os presidentes reconheceram a janela de oportunidade política que a Cúpula UE-CELAC representa para se chegar a um acordo definitivo.
  7. Examinaram, igualmente, a situação na Ucrânia e reafirmaram-se nas Resoluções da Assembleia das Nações Unidas que ambos os países apoiaram desde março de 2022, condenando a invasão russa e as tentativas de anexação territorial, e reafirmando os princípios de soberania e integridade territorial contidos na Carta da Nações Unidas. Mencionaram, igualmente, as iniciativas de diferentes países com vistas a uma solução pacífica. O presidente Lula explicou sua iniciativa de Paz ao presidente Sánchez, que a acolheu com interesse. Por sua vez, o presidente Sánchez expressou seu apoio ao Plano de 10 pontos para a Paz da Ucrânia. Ambos os líderes coincidiram em condenar os ataques a civis no conflito e fizeram um forte apelo por respeito ao direito internacional humanitário. Refletiram, também, sobre como a invasão e suas consequências estão exacerbando as debilidades da economia global, em particular nos mercados energéticos, de alimentos e de outros produtos, e defenderam intensificar a cooperação bilateral, birregional e multilateral para abordar os problemas de desabastecimento e carestia que se estão produzindo nos países mais vulneráveis.
  8. Compartilham a convicção de que, assim como outras organizações internacionais tiveram que mudar para melhor preparar-se para os desafios do século XXI, o Conselho de Segurança das Nações Unidas também deve ser reformado e ampliado para aumentar sua eficácia e transparência, bem como sua representatividade e legitimidade.
  9. Ambos os presidentes compartilharam o compromisso histórico de seus respectivos países com os direitos humanos e com a promoção da dignidade da pessoa. Reconheceram que o tráfico de escravos e a escravidão estão entre as mais graves violações dos direitos humanos cometidas na história da humanidade. Da mesma forma, concordaram em considerar o racismo, a xenofobia e a discriminação racial como problemas a serem combatidos em todas as suas manifestações. Comprometeram-se a combatê-lo em seus países, a promover a igualdade racial nos diferentes fóruns internacionais dos quais participam e a retomar a cooperação bilateral em matéria de igualdade racial com ações em áreas como esportes, educação, trabalho e ação afirmativa.
  10. No plano das relações bilaterais, destacaram a solidez das relações econômicas e as boas perspectivas de continuar a reforçá-las. Tomaram nota da importante posição investidora da Espanha no Brasil, investimento com perspectiva de longo prazo e com significativa geração de emprego e riqueza. Coincidiram quanto à importância de continuar a propiciar condições de estabilidade e segurança jurídica que permitam sua crescente diversificação e abrangência. Tomaram nota com satisfação, igualmente, da evolução positiva do comércio bilateral, que em 2022 atingiu intercâmbio em ambas as direções no valor de 12,685 bilhões de euros, convertendo o Brasil no primeiro sócio comercial da Espanha na Ibero-américa. Nesse sentido, celebraram o êxito do Encontro Empresarial organizado em Madri por ocasião desta visita, que destacou a importância do diálogo construtivo para fortalecer os investimentos bilaterais, elemento chave no desenvolvimento econômico e social de nossos países. Ambos os presidentes compartilham a importância de manter um canal de comunicação regular aberto em ambos os governos para que os investidores dos dois países possam transmitir suas sugestões e inquietudes.
  11. Manifestaram o desejo de ambos os governos de aprofundar e aperfeiçoar o diálogo para definir os elementos de um novo programa de cooperação para o desenvolvimento sustentável entre os dois países.
  12. Neste contexto, expressaram sua satisfação com a celebração da primeira reunião da Subcomissão de Cooperação Técnica da Comissão Permanente Bilateral Brasil-Espanha, realizada em 17 de abril de 2023, em Madri, na qual foi decidido que este novo programa bilateral terá as seguintes áreas de cooperação prioritárias iniciais: a) desenvolvimento sustentável na região amazônica, incluindo a gestão de recursos hídricos; b) meio ambiente e mudanças climáticas, na perspectiva de transição justa; c) gênero; d) fomento de políticas públicas relativas aos direitos dos povos indígenas, das comunidades afrodescendentes e de outros grupos de população vulnerável; e) fomento do diálogo social, incluindo os intercâmbios entre organizações sindicais; f) promoção da formação dos atores da cooperação descentralizada; e g) capacitação em temas de pesca e aquicultura, incluindo aspectos relacionados ao bioma amazônico.
  13. Em outras áreas de cooperação, a Subcomissão identificou a América Latina e o Caribe, incluindo Haiti, e a África como áreas de interesse prioritário para as iniciativas de cooperação triangular/trilateral com base nas demandas dos países sócios.
  14. Abordaram a conjuntura econômica global e os desafios específicos de cada país em matéria de inflação, emprego, crescimento, energias renováveis e abertura econômica, e reconheceram o importante papel da coordenação multilateral que constitui o G20, do qual ambos os países participam desde a primeira reunião no nível de líderes. Ambos os presidentes concordaram em reforçar sua coordenação às vésperas da presidência brasileira do grupo em 2024, valorizando a participação plena e proativa da Espanha com vistas a lograr resultados concretos.
  15. Conversaram sobre as reformas tributárias necessárias em ambos os países para, mantendo a estabilidade fiscal, ampliar a capacidade financeira e redistributiva do Estado para atender às necessidades dos segmentos mais desfavorecidos da população e garantir os investimentos necessários para promover o desenvolvimento sustentável em suas três dimensões – econômica, social e ambiental – e a inclusão digital, e acordaram o estabelecimento de um grupo de trabalho em matéria fiscal, que permita compartilhar as lições mais importantes aprendidas neste campo entre especialistas de ambos os países.
  16. Da mesma forma, foram abordados temas de tributação internacional que interessam a ambos os países e a seus atores econômicos. Os dois presidentes fizeram referência ao interesse de ambas as partes em atualizar o acordo existente entre os dois países para evitar a dupla tributação em matéria de impostos sobre os rendimentos, para incorporar as medidas BEPS que os dois países se comprometeram a implementar no marco do acordo da OCDE e do G20 sobre erosão de base tributável e transferência de lucros. Do lado brasileiro, expuseram-se as perspectivas de reforma de seu sistema tributário, tanto da tributação da renda como do consumo, e do desejo de que se facilite as exportações e os investimentos. Na reunião, deu-se impulso às perspectivas de cooperação e intercâmbio de boas práticas entre a Secretaria de Estado da Fazenda da Espanha e a Secretaria Extraordinária da Reforma Tributária e a Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil neste contexto.
  17. Tomaram nota dos progressos obtidos com a assinatura em novembro passado de um Memorando de Entendimento em matéria de defesa e indústrias de defesa e dos trabalhos da comissão bilateral neste campo.
  18. Em matéria de transportes, o presidente Lula informou a profunda transformação que o Brasil está realizando e ambos os presidentes coincidiram quanto ao interesse de reforçar a cooperação neste campo, no qual operam há anos as mais importantes empresas espanholas do setor.
  19. Ambos os presidentes reconheceram a importância de fomentar o ensino de espanhol no Brasil, inclusive no ensino médio brasileiro, e acordaram a convocação de um grupo de trabalho para estudar as medidas normativas e de apoio que se possam tomar nesse sentido. Tomaram nota, também, das iniciativas brasileiras para o ensino de português na Espanha, tais como os leitorados brasileiros na Universidade Complutense de Madri e na Universidade Santiago de Compostela, as atividades da unidade do Instituto Guimarães Rosa em Barcelona. Nesse sentido, tomaram em conta o papel dos auxiliares de conversação brasileiros que se incorporaram a diferentes centros de ensino espanhóis para apoiar o ensino de português e promover a cultura brasileira, assim como os programas espanhóis de leitorados em universidades e de auxiliares de conversação em institutos federais, que estão impulsionando o ensino de espanhol no Brasil.
  20. Reconheceram a importância da declaração sobre o bilinguismo e a promoção do uso do espanhol e do português como línguas de comunicação e de trabalho nos âmbitos da ciência, tecnologia, inovação, cultura e relações internacionais adotada na recente Cúpula Ibero-americana em São Domingos, bem como os resultados positivos dessa Cúpula, como a admissão da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP) como observadora consultiva da Conferência Ibero-Americana. Ambos os presidentes reafirmaram seu compromisso com o processo de Cúpulas e com a Comunidade Ibero-Americana.
  21. Expressaram interesse em explorar novas possibilidades de cooperação entre o Instituto Cervantes e o Instituto Guimarães Rosa para a promoção do espanhol e do português e o desenvolvimento de iniciativas conjuntas nos domínios cultural e educacional.
  22. Promoveram o compromisso de dinamizar a cooperação cultural, tanto no nível bilateral como ibero-americano, impulsionando contatos entre as autoridades culturais nacionais dos dois países com vistas a fomentar a cooperação artística e a coprodução audiovisual.
  23. Ambos sublinharam sua preocupação com os impactos crescentes da mudança climática sem precedentes em todo o mundo no contexto da emergência climática em nível global, conforme destacado no Sexto Relatório de Avaliação (AR6) do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC). Sublinharam a urgência de acelerar os esforços globais em matéria de mudança climática em linha com a melhor ciência disponível para o cumprimento efetivo dos objetivos da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança Climáticas (UNFCCC) e seu Acordo de Paris. Neste contexto, reconhecem a importância da próxima Conferência do Clima de Dubai (COP28) para que a comunidade internacional aumente seus esforços coletivos na luta contra as mudanças climáticas, inclusive no que diz respeito à mobilização de recursos financeiros adequados e meios de implementação, em linha com os compromissos assumidos na UNFCCC e seu Acordo de Paris. Neste contexto, destacam sua vontade de trabalhar para alcançar resultados ambiciosos e equilibrados que permitam gerar as condições necessárias para implementar com urgência uma transição justa, de um sistema baseado em combustíveis fósseis para um sistema baseado em energias renováveis, reduzindo drasticamente as emissões de gases de efeito estufa para atingir as metas de temperatura do Acordo de Paris, bem como avançar nas agendas de adaptação e perdas e danos.
  24. O Presidente Sánchez saudou a candidatura do Brasil para a realização da Conferência do Clima (COP 30) na cidade de Belém do Pará em 2025. O governo espanhol toma nota de que o Brasil apresentou a candidatura da cientista brasileira Thelma Krug para presidir o Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC).
  25. O Presidente Lula relatou os esforços de seu país para enfrentar os desafios a que se vê afetada a Amazônia. O Presidente Sánchez referiu-se à continuidade do Fundo Geral de Cooperação da Espanha no Banco Interamericano de Desenvolvimento para a promoção do desenvolvimento sustentável na Amazônia e do desejo da Espanha de propiciar e compartilhar amplo apoio internacional aos esforços do governo brasileiro para a conservação e uso sustentável da biodiversidade amazônica. Ambos os presidentes congratularam-se pela adoção do Quadro de Biodiversidade Global de Kunming-Montreal na COP15 CDB, afirmaram seu compromisso com a cooperação para implementar este novo quadro e ressaltaram a importância dos três pilares da Convenção e do fornecimento de meios de implementação para deter e reverter a perda de biodiversidade.
  26. A Espanha e o Brasil reiteram o compromisso mútuo recentemente firmado por meio de Memorando de Entendimento (MdE) entre a Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico (ANA) do Brasil e a Direção Geral de Águas (DGA) da Espanha para intensificar a cooperação técnica na gestão dos recursos hídricos e na regulação dos serviços de saneamento e melhoria da eficiência no uso da água.
  27. Ambos os países reconhecem que nenhum país está imune à seca e a seus impactos sobre os alimentos, a água, a segurança energética, a migração forçada e a degradação da terra e comprometem-se a trabalhar conjuntamente para minimizar seus impactos. O Presidente Sánchez expôs a Aliança Internacional para a Resiliência à Seca, iniciativa apresentada pela Espanha juntamente com Senegal na última COP27 realizada no Egito. O Presidente Lula expressou disposição de estudar a possiblidade de unir-se ao grupo de países e organismos internacionais que a compõem.
  28. Espanha e Brasil expressam sua vontade de cooperar e avançar na transição energética para uma economia neutra em carbono, levando em conta os imperativos de segurança energética, do aumento da oferta de energia e da universalização do acesso à energia limpa a baixo custo. Ambos os presidentes acordaram seguir fortalecendo a agenda energética, em relação à qual o compromisso político e social inclua todas as ferramentas necessárias para alcançar metas comuns, identificando oportunidades de ação no desenvolvimento de novas tecnologias para alcançar a neutralidade de carbono, com uma abordagem que busca a igualdade, a equidade de gênero e o respeito aos direitos humanos, especialmente dos grupos mais vulneráveis. Ademais, ambos os países aprofundarão o desenvolvimento de soluções tecnológicas, em particular das energias limpas e renováveis.
  29. Agradecendo a hospitalidade recebida na Espanha, o Presidente Lula da Silva convidou o Presidente Sánchez a visitar o Brasil, o que foi aceito pelo Presidente de Governo de Espanha em data a ser acordada conforme a disponibilidade de ambos.